Dominique Edouard Baechler
Era uma vez uma criança, lá longe, do outro lado do mar, que nasceu num mundo repleto de
gritos,
de fuzilamentos, de guerras. O céu era negro, a natureza triste; não mais folhas nas
árvores, não mais
campos com ricas culturas, nada de flores. Hordas humanas errando sobre uma terra árida e
hostil.
Então a criança, como um pássaro, voa além mar até uma região quente, exuberante, cheia
de
flores, de danças e de jogos. A terra é vermelha, o céu é azul, a alegria tem todas as cores
do arco-íris.
A criança revive, cresce, torna-se adulta. O jardim revigorado nela desabrocha,
encorajando-a a
pintar, a traçar e retratar o milagre da vida e do amor vitorioso. Sua memória, como o
pássaro,
atravessa e reatravessa o mar, mas sua mão sobre a tela fixa o instante …
Partir da Europa devastada pela Segunda Guerra Mundial para chegar às florações dos
trópicos
é uma imensa viagem física e intelectual, até o fim do mundo e até o fim de si mesmo. Viagem
para
o maravilhoso, o absurdo, o Belo ideal… Viagem que Paulina cumpre no seu cotidiano de
artista.
Com uma técnica virgem de todo conformismo estético, um anti-academismo que lhe faz
ignorar
as leis da perspectiva bem como as normas do unidimensional, a artista transborda sua
imaginação,
ultrapassa os limites esmagadores do suporte, para invadir a moldura, varrendo todas as
convenções.
Usando a pintura normal, e às vezes também os velhos truques da colagem , ela tenta atingir
a terceira
dimensão com pedaços de tecido ou de papel, como fizeram antes os cubistas.
Buscando em seu universo interior e seu campo visual imediato, quarto, sala, atelier, pedaço
de
jardim ou de praia, que formam seu microcosmo, Paulina reconstrói, com suas próprias leis,
aquelas
da fantasia e do sonho: metáfora da Arte, percurso dos Poetas, esses “professores de
esperança” –
como os chama Jean Giono …
Transcrever através de temas simples, cotidianos, alguns dados sensoriais; ultrapassar
resultados
simplesmente pictóricos para alcançar valores líricos e interiores, a arte de Paulina nos
faz descobrir
relacões inéditas entre coisas banais. O kilim multicor “à la Matisse” nos
lembra o decorativismo
tradicional da Europa Central – sua cultura de origem. Os móveis, os interiores,
carregados de toque
caloroso e confortável, simbolizam a doçura do lar; o cão, a fidelidade; o horizonte azul do
mar, o
encanto frente à Criação.
Encarnação do mistério da arte no estado puro, como toda busca chamada “naif’, a
obra de
Paulina Pinsky aqui está para intrigar, seduzir e, finalmente, nos raptar na eterna
conquista da
felicidade.
Dominique Edouard Baechler
Crítico de Arte da ABCA-AICA
1995
Once upon a time, there was a child who lived in a faraway land
across the sea. She was
bom in a world of terror, executions and war. The sky was dark and nature was grey.
The
fields were no longer green; there were no flowers or leaves on the trees. Thousands
of
people roamed the dry, hostile land.
The child then crossed the ocean and arrived in a warm,
exuberant and colorful country.
The land is red, the sky is blue and the colors of the rainbow symbolize happiness.
There are
dances and games. The child grows up in this land and becomes an adult. ln her, a
garden
blooms and she feels like drawing, sketching, portraying the miracle of life and the
victory of
love. Her memory, like a bird, flies back and forth across the ocean, but her hand
eternalizes
precious moments on canvases.
To leave a devastated war-torn Europe and arrive in the tropics
is an enormous physical
and intellectual trip. It is a trip to the end of the world and into one’s deepest
self. It is a
wonderful, absurd and beautiful trip. A trip that Paulina, as an artist, takes
everyday.
Ignoring perspective and unidimentional rules, with a virgin
technique as far as aesthetic
conformity is concerned, the artist’s Imagination flows and unconventionally
invades the
frame. By means of regular painting and tricks with collages, she tries sometimes to
reach the
third dimension with pieces of cloth or paper as the cubists once did.
From the surroundings that form her microcosm, bedroom,
living-room, studio, glimpse
of garden or beach, and from her inner self, Paulina, using her own rules,
reconstructs
fantasy and dreams reaching the metaphor of Art – the path of the Poets, these
“teachers of
hope” – as Jean Giono calls them …
Paulina makes us realize novelties among common, everyday
things. She does this through
simple and sometimes sensorial themes where interior, pictorial and Iyrical values are
attained.
The multi-color kilim, à la Matisse, reminds us of the traditional décor of Mid-Europe,
her
cultural origin. The furniture and interiors with their “warm touch”
symbolize the sweetness
of home; the dog, fidelity, the blue horizon of the sea, enchantment upon
Creation.
ln the incarnation of the mystery of art in its purest state
and in the very search called
“naive”, Paulina Pinsky is here to seduce, intrigue and finally abduct us
from the eternal
struggle in search for happiness.
Dominique Edouard
Baechler
Art critic ABCA-AICA
1995